segunda-feira, 1 de julho de 2013

Nunca cheira a carne na minha rua

Nunca cheira a carne na minha rua.

O apodrecimento gradual
do sítio a que um dia chamámos
ou gostaríamos de ter chamado
casa
é agora um barracão decrépito
a cair
telha a telha
tijolo a tijolo
pestana a pestana
ficando apenas o pó
dos cantos indiscretos
que nunca pensámos
tornar-se tão visível.

A nudez grotesca
embora irrepreensível
revolve-nos as entranhas
num jogo macabro
de luz e sombra.

O nosso corpo
mais um vulto sem reflexo
mais uma carcaça
depósito de coisas passadas
vazias
levadas pelo tempo.

Restos.

Restos de coisa nenhuma.
E a nossa rua?
E a nossa casa?
Nem pegadas
nem ruínas.
O vento levou-nos.